Considerações sobre a elaboração de um informe
psicopedagógico[1]
Simone Carlberg[2]
Para a elaboração de um informe
psicopedagógico, é preciso, inicialmente, ter clareza de seu objetivo, uso e
função dentro de um processo diagnóstico, seja ele clínico ou institucional.
A busca desta clareza pode ser
iniciada a partir da conceituação da palavra informe e laudo. Laudo, aqui
incluída, enquanto palavra e idéia por ser também um termo empregado entre
educadores, psicólogos e outros profissionais da área da saúde e educação.
Vejamos, então: segundo o dicionário
Aurélio,
informe significa: informação, documento,
fotografia, mapa, relatório ou observação referente ao inimigo ou a uma
conjuntura complexa, e que pode contribuir para esclarecer a situação dele ou
dela.
laudo
significa: parecer
do louvado ou árbitro, louvação, louvamento. Peça escrita, fundamentada, na
qual os peritos expõem as observações e estudos que fizeram e registram as
conclusões da perícia.
Tanto um termo, como o outro, podem
servir para nomear o documento que produzimos ao final de um diagnóstico, no
entanto, o termo informe parece ser mais completo, pois se refere a fotografia
de um conjuntura complexa que, no caso da Psicopedagogia, é o que se pretende
ao final de um diagnóstico: uma fotografia do sujeito pesquisado. Fotografia,
no sentido de “um jeito de ver, de observar a realidade”, pois as conclusões ao
final de um diagnóstico são o resultado da maneira de olhar a realidade,
fundamentado em referenciais teóricos, filosóficos, ideológicos... Dependendo
da câmera que se utiliza para fotografar, a foto terá uma qualidade e cabe ao
fotógrafo escolher o ângulo para captar a melhor imagem. Parece que o termo
informe dá uma idéia melhor de movimento, ao mesmo tempo que registra um tempo,
uma forma de desvendar uma realidade.
Feitas essas considerações, devemos
esclarecer que o informe psicopedagógico, além de ser a síntese de um processo
diagnóstico, é também, a forma escrita daquilo que denominamos entrevista
devolutiva.
Devolutiva é um termo que só aparece
no dicionário enquanto adjetivo e significa:
devolutivo:
“que devolve. Que determina devolução; devolutório.
O
significado de devolver nos auxilia na compreensão da intenção desta
entrevista, ou seja:
devolver:
“mandar ou dar de volta. restituir. Dizer em resposta, replicar, retrucar...
refletir, retratar... recambiar.
A
intenção é, de fato, em uma sessão de entrevista devolutiva levar o sujeito a
refletir sobre uma determinada situação, e se conseguirmos levá-lo a recambiar
(dar uma volta inteira com o corpo), quer dizer, olhar para todos os ângulos,
estaremos conseguindo cumprir nosso objetivo de provocar uma mudança, ou pelo
menos, um movimento de reflexão.
Para realizarmos, tanto a entrevista
devolutiva, quanto produzirmos um informe psicopedagógico, precisamos seguir
alguns passos técnicos, ou seja, temos que aprender a comunicar ao outro as
conclusões, sem agredir, sem gerar culpas, tentando esclarecer, no decorrer da
entrevista, aquilo que, segundo o nosso ponto de vista, percebemos como
sintomas, obstáculos e possíveis causas. Além desses aspectos, temos que
apontar para um prognóstico e fazer indicações.
Quanto ao aspecto técnico da
produção de um informe, deve-se levar em consideração os seguintes aspectos:
- a quem se
destina: definir para quem escreveremos é o primeiro passo, pois quando se
trata de um informe destinado a um colega, o conteúdo pode ser mais
técnico; quando se trata, no entanto, de um documento para ser entregue a
um pai, a uma companhia de seguro saúde, a uma escola, uma empresa, temos
que ter o cuidado de não expor o sujeito pesquisado usando termos que
possam rotulá-lo, até mesmo prejudicá-lo, pois não há como garantir o uso
que as pessoas podem fazer do documento que produzimos. Não se pode perder
de vista que, neste documento, estaremos descrevendo como o sujeito ESTÁ
no momento, segundo o nosso ponto de vista. Um sujeito não É, ele
ESTÁ!
- Forma de
apresentação: já que se trata de um documento por escrito, permanecerá
existindo de forma diferente daquilo que é verbalizado na entrevista
devolutiva. É um documento assinado por seu autor, um profissional que
trata de dificuldades de aprendizagem, portanto, deve haver um compromisso
com a qualidade da forma e do conteúdo. Este documento deve ser produzido
levando-se em conta, o tipo de papel, a formatação, questões gramaticais,
ortográficas, entre outras.
- Conteúdo:
mais importante do que a forma, pode-se estabelecer um roteiro, com uma
introdução, citação dos instrumentos utilizados para a realização da
pesquisa, análise dos resultados, prognóstico e indicações. Na introdução
caracteriza-se o sujeito pesquisado, por exemplo:
Diagnóstico Psicopedagógico no âmbito
institucional:
Conforme contrato estabelecido com esta instituição de
Ensino Fundamental, pretendemos por meio deste documento, informar sobre o
trabalho desenvolvido com a 3ª série A...
ou,
Diagnóstico Psicopedagógico no âmbito
clínico:
João da Silva, nascido em 10.nov.2004, filho do Sr.
Fulano e da Srª Fulana, aluno da 1ª série do Ensino Fundamental, na escola
Aprendendo, foi submetido a uma avaliação psicopedagógica, solicitada por... em
função da seguinte queixa:...
Citação dos instrumentos utilizados na pesquisa: não há
necessidade de detalhar a aplicação dos mesmos, mas é importante citá-los
indicando as dimensões pesquisadas, sem perder de vista a quem se destina o
documento.
Análise dos resultados: este é o recheio do texto. É o
momento de relatarmos o que concluímos, articulando a queixa, os sintomas, os
obstáculos e as possíveis causas. O cuidado tem que ser dobrado, pois uma frase
mal construída pode gerar dupla interpretação. É claro que um texto, um artigo,
é sempre entendido segundo a perspectiva do leitor, porém, nossa tarefa é
produzir um documento que sintetize o que observamos, pensamos, sem contudo,
agredirmos o sujeito que descrevemos. O mesmo ocorre na entrevista devolutiva,
onde a utilização de analogias podem ser mais úteis do que termos técnicos.
Em minha experiência clínica, ao atender famílias
vinculadas a um convênio com uma indústria de peças de meios de transporte
pesado, eu utilizava, para situações de obstáculo epistemofílico, a analogia
como combustível utilizado em caminhões. Em geral, as famílias reagiam bem,
pois eu utilizava o repertório deles para explicar o que poderia estar
ocorrendo com o sujeito pesquisado.
Prognóstico e indicações: Visca[3] faz uma diferenciação entre um prognóstico
científico uma profecia popular. Para o
prognóstico, deve-se levar em consideração três níveis: qual será a evolução
futura do sujeito pesquisado no caso de?
1. não ser submetido a um processo de intervenção;
2. de ser submetido a um processo ideal de intervenção;
3. de ser submetido a um processo de intervenção
possível.
A diferença entre a profecia e o
prognóstico científico, está na fundamentação
utilizada
para pensarmos no futuro deste sujeito. Jamais poderemos conduzir um
prognóstico fechado, afirmando que o sujeito não conseguirá, ou conseguirá
algo, pois o ser humano surpreende com sua reações. Retomo aqui a idéia: o
sujeito não É, ESTÁ.
Juntamente com o prognóstico estão as indicações, que
nada mais são, do que a forma que toma o prognóstico. Por exemplo: processo de
intervenção ideal: como é, a que se refere, qual a metodologia indicada, qual o
tempo de duração (curto, médio, longo prazo), freqüência, entre outros aspectos
que julgamos pertinentes, como sugestões, orientações aos pais e/ou escola.
Está encerrado o informe, é só
assinar, envelopar e entregar ao destinatário, preferencialmente em mãos para
possibilitar a reflexão conjunta, minimizando a possibilidade de interpretações
confusas ou inadequadas.
[1] Artigo publicado no Boletim
Informativo ago/set 2000 ABPp – seção Paraná Sul
[2] Pedagoga. Psicopedagoga.
[3] para aprofundamento do tema
prognóstico e indicações, sugere-se a leitura do capítulo El pronóstico y
las indicaciones. VISCA, Jorge. Clinica Psicopedagogica – Epistemologia
Convergente. AG Servicios Graficos. Buenos Aires : 1994.
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